3 de julho de 2013

Do pavilhão da Ajuda para a Mulholland Drive

Se fosse o Godinho a ter apresentado a reestruturação financeira aos sócios, esta não teria sido aprovada. Todos os “croquettes” o disseram e quase todos os Sportinguistas o pensaram.

 E é verdade. Se tivesse sido o Godinho a apresentar uma hipoteca do estádio de Alvalade e a entrada de capital angolano na SAD aos sócios  no passado domingo, acho que o homem teria sido cozinhado vivo ali no "forno" do Pavilhão da Ajuda.



 Há uma cena absolutamente brilhante num dos últimos filmes do David Lynch, Mulholland Drive, onde a Betty Elms (Naomi Watts), interpretando uma ingénua e sonhadora aspirante a acriz de cinema, tem de realizar uma audição numa pequena sala claustrofóbica e intimadora, perante o olhar atento e sabujo de velhos produtores, agentes e actores, todos eles pouco impressionáveis.

Para se preparar, num par de cenas anteriores à que mencionei acima, Betty utiliza a sua recém-amiga, Rita (Laura Harring), para a ajudar a decorar e interpretar melhor o papel que terá de enfrentar dali a pouco tempo. Nota-se a inseguridade, a timidez, o nervosismo, a impreparação de Naomi enquanto vai debitando as palavras do guião que parece "guiar" o desempenho de Betty e não o contrário. Ninguém consegue “acreditar” naquela interpretação… Nem a própria Betty.






 Contudo, na tal cena brilhante que falei , Betty surpreende tudo e todos. Parece mesmo outra Betty, uma alter-ego qualquer chamada Diane (se virem o filme todo, perceberão) com qualidades completamente opostas à da Betty “inocente". Numa audição arrebatadora - Betty inicia-a de uma forma imponente, autoritária, “guiando” o texto a seu belo prazer -, a jovem garota desconhecida chega ao fundo da alma que ainda resta dos velhos corpos decrépitos dos “senadores” de Hollywood que assistem à audição, e estes, deslumbrados com a performance da miúda que tinha o sonho antigo de ser actriz, não hesitaram e contrataram-na de imediato.

Todos ficaram de boca aberta perante tal momento e todos “acreditaram” na interpretação de Betty.

Contudo, as palavras eram as mesmas, o texto era o mesmo que Betty testou com a sua amiga Rita dias antes e cujo desempenho tinha sido horrível, e agora, com as mesmas páginas, com o mesmo texto, com o mesmo guião, o resultado final já era excelente, deslumbrante, magnífico?

 O mesmo se passou com o Godinho e Bruno de Carvalho. Godinho foi a Betty insegura, hesitante, impreparada e cuja interpretação na cozinha com Rita não entusiasmou ninguém. Nem a ela própria, quanto mais aos sócios.

 Bruno de Carvalho é a Betty pujante do Pavilhão da Ajuda, firme, confiante e que acredita verdadeiramente no que diz e que faz os outros acreditarem nele. É assim.

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