É por isso que gostamos de chegar a casa às sete da tarde, ligar a televisão e começar a jantar ao mesmo tempo que ouvimos o Fernando Mendes a dizer "Expetáculoooo" e inclinamos a cabeça quando aparece a Lenka, sempre na esperança que seja hoje que a blusa caia e mostre mais do que apenas o preço certo da fritadeira elétrica.
A nova temporada começava sempre da mesma forma. "Este ano é que é!". Novo presidente, novo treinador, novos jogadores, "vamos ganhar", jogo no Dragão, presidente, sorridente, ao lado de Pinto da Costa, acabava o jogo, nova derrota, "Fomos roubados", vociferava o treinador. E fomos nos habituando a isto. Era normal.
O Ned Flanders é(ra) a personagem mais sportinguista dos Simpsons. O Homer enfia o carro pelo jardim adentro da casa dele e o mais áspero que ouvimos da boca do Ned é um "Okilly-dokilly!". O Homer pede emprestado o berbequim durante dez anos e quando Homer se nega a devolvê-lo, sai apenas um singelo "Hey-Diddly-Ho!" como resposta. E sorrimos sempre que tal acontece. E sentimos simpatia e pena. Estamos habituados.
Não é por nada que Os Simpsons já cá andam há vinte e tal anos.
Mas se me perguntarem qual o episódio mais marcante do Ned Flanders na série, o episódio que nunca esquecerei, vou responder aquele em que ele um dia se chateou com tanta benevolência e tanta patifaria e, finalmente, deu um murro na mesa. O episódio chama-se "Hurricane Neddy" (O furacão Neddy) e, como o título indica, foi o episódio em que o Ned se passou dos carretos, farto de ser enganado, ultrajado e enganado pelo mundo e os seus vizinhos.
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eheh Ned Flanders e Breaking Bad, que combinação! |
Percebo que quem estava habituado a ver o Flanders a ser humilhado constantemente pelo Homer, episódio após episódio, se sinta defraudado e não tenha gostado do episódio em que a posição quadrúpede do Flanders tenha dado lugar a uma posição mais bípede da personagem mais católica da série. Percebo perfeitamente.
Mas, se algures na oitava temporada, os produtores de Os Simpsons não têm decidido dar voz à personagem de Ned Flanders, provavelmente ele faria agora parte das personagens que já não têm voz.
De que episódio se querem lembrar daqui a vinte anos? Aquele em que morremos ou aquele em que demos um murro na mesa?
Eu sei bem qual é a minha resposta.